No dia 25 de junho, cartomantes brasileiros celebram o Dia do Baralho Lenormand, em memória de Marie Anne Adelaide Lenormand (1772–1843). Como se sabe, ela não é a autora deste oráculo — uma jogada de marketing da editora após a sua morte — mas a referência é amplamente aceita.
Fui convidado a participar desta blogagem coletiva. Sou tarólogo, mas aceito o convite como simbologista, costurando diferentes saberes, tradições e sentidos a respeito da Raposa, carta de número 14 no Lenormand.
A Raposa Lenormand: alerta e astúcia

Nos contos de fadas, a raposa aparece ligada à astúcia, ao engano e à traição. Sua aproximação é sorrateira; a fala, sedutora. No Lenormand, a Raposa alerta para armadilhas, fraudes e enganos. Observa mais do que fala, recolhe informações e age de modo dissimulado.
A recomendação é clara: não confie em elogios fáceis, propostas sedutoras ou galanteios. A desatenção diante da Raposa costuma custar caro.
Embora lembre a Serpente, há distinções. A Serpente aponta para rivalidade direta e ações mal intencionadas; a Raposa é oportunista, aproveitando brechas para benefício próprio. A Serpente é adversária específica, alguém que ficaria feliz com o seu prejuízo. A Raposa age assim com qualquer pessoa, sempre que vê vantagem. Só pensa em si própria.
Também me recordo de uma leitura em que descreveram a Raposa para mim como uma mulher ruiva encantadora — a Raposa como atributo físico e só — e isso, de fato, aconteceu. Ponto para o Lenormand.
A Raposa em outros oráculos e culturas
Essa complexidade simbólica da Raposa não se limita ao sistema Lenormand, aparecendo em outros oráculos e culturas.
No Medicine Cards (Cartas Xamânicas), de Jamie Sams, e no Druid Animal Oracle, de Philip e Stephanie Carr-Gomm, simboliza adaptabilidade, astúcia e observação estratégica.

No Druid Animal Oracle, adicionalmente, transita entre os mundos físico e espiritual. Nas Cartas Xamânicas, também possui a “medicina da invisibilidade”, de observar sem interferir, identificando padrões e aprendendo sem chamar atenção para si.
Isso pode exigir paciência, mas faz parte de uma estratégia bem pensada para agir no momento certo. Vale notar, porém, que o contexto é fundamental na interpretação: ser “esperto como uma raposa” pode tanto indicar sagacidade e raciocínio rápido quanto comportamento trapaceiro.
No campo das frases populares, ainda temos o “raposa velha” — alguém vivido que é difícil de enganar; está sempre a um passo ou dois na sua frente.
Esses oráculos, como você pode ver, destacam sua face luminosa: inteligência criativa, fala diplomática e articulação que abre caminhos.
No folclore japonês, as kitsunes podem ser zenko (benevolentes) ou yako (maliciosas). Acho que é uma boa reflexão para interpretar a Raposa em jogo: ela não é uma coisa só. As raposas são seres inteligentes cujos poderes crescem com a idade e sabedoria, mostrando a ambiguidade entre luz e sombra.
A Raposa de Maquiavel: estratégia versus astúcia
Alguns associam a Raposa à carreira profissional, naturalizando a astúcia como padrão. Embora “astúcia” implique habilidade de enganar, reduzir a carta a isso empobrece seu significado. Também reforça a ideia de que o ambiente profissional, especialmente o corporativo, é um lugar em que não se pode confiar nas pessoas. Não recomendo essas generalizações.
Maquiavel escreveu:
“Tendo o príncipe necessidade de saber usar bem a natureza do animal, deve escolher a raposa e o leão: pois o leão não sabe se defender das armadilhas e a raposa não sabe se defender da força bruta. Portanto, é preciso ser raposa para conhecer as armadilhas, e leão para aterrorizar os lobos.”
A Raposa é inteligência prática, prevenção e adaptação, não apenas fraude.
Aprender com a Raposa
Como ouvi no II Encontro Carioca de Baralho Cigano, organizado pelo Alexsander Lepletier, ampliar o repertório simbólico enriquece as leituras. A Raposa alerta para enganos, mas também simboliza sagacidade, sobrevivência e criatividade.
Celebrar o Dia do Baralho Lenormand com esta carta lembra que os símbolos exigem interpretação e diálogo. A Raposa nos ensina tanto a precaução, alertando-nos para enganos e armadilhas, quanto a sabedoria prática — como ser estratégico, observador e adaptável.
Temos muito a aprender dessa dualidade, desconfiando do que nos ilude e cultivando uma inteligência criativa diante da vida.
Possam todos se beneficiar!
#journeelenormand
Destaque: Foto de Joseph Yu, no Pexels.











